Alicia Granci: “Sí, soy argentina”
“É louco que nesse momento nós estamos quase como prisioneiros, não somos prisioneiros mas não podemos sair da maneira como saíamos. É contraditório. Enquanto o que diz respeito a minha família, por ser estudante internacional, estamos um pouco acostumados porque sabemos o que é estar longe dos nossos entes queridos,” me fala Alicia Granci, numa quinta feira a noite, apoiada contra a cama de seu quarto, enquanto eu a escuto da minha sala através de uma ligação de video.
“Creio que já estamos mentalmente preparados porque sabemos que temos que ser fortes e seguir adiante com os nossos projetos, que no caso é estudar,” completa a estudante argentina, que hoje vive na Austrália.
Alicia e eu já nos conhecemos há alguns anos. Fazemos o mesmo curso da universidade, dividimos a identidade de sulamericanas e uma paixão por Salsa. E esse ver na tela alguém que faz parte do cotidiano dá um ar de mais (su)real à pandemia – aliás, todas as entrevistas dessa série tem um quê de fantástico e experimentação, de mirar nos olhos sem ollhar nos olhos. Mas isso é reflexão para depois.
Voltemos à Alicia. Nesse nosso cenário pandêmico de entrevista, ela me conta sobre como tem sido ficar mais em casa e de como a relação com a família australiana – uma mãe e uma filha – que mora com ela mudou. “Sempre tive uma boa relação com elas, mas como eu estava quase sempre fora de casa, na universidade ou no trabalho, eu nunca tinha um momento de sentar com elas e conversar. E agora nos sentamos e falamos da vida, temos muito mais interação. Esse contato humano é super importante em todos os parâmetros, então o que já tinha de lindo, se intensificou por cem.”
Ela também comenta sobre a relação com a família de volta na Argentina. Ainda que não fale com eles todos os dias, diz como ligar para eles a faz feliz. “Ver o sorriso deles, é como algo que eu to desfrutando,” fala. Mas acrescenta sobre a dificuldade de lidar com a incerteza de não saber quando vai poder vê-los fisicamente de novo. “É como ‘ai, que vontade que eu tenho de abraçá-los’. Não sabemos quando vamos poder viajar, então temos que pensar positivo de que vamos vê-los de novo.”
E com a voz cheia de orgulho e carinho, Alicia acrescenta sobre o amor por sua terra. “Sempre, desde que nasci, a Argentina está no meu coração, desde o minuto zero. E acho que isso não vai mudar. Creio que o que acontece com todos os latinos ao sair é que vemos muitas coisas que pensamos ‘quisera eu que nós pudessémos estar na altura do país em que vivemos agora’, pelo menos em condições de saúde, por exemplo. Mas esse amor e apreciação, apesar das carências que a Argentina tem, não vão faltar, porque é onde nasci e onde eu me sinto identificada constantemente. E quando eu tomo um mate, é quando eu me sinto ‘sí, soy argentina’.”

Foto cedida por Alicia Granci
“Nesse momento eu to muito feliz que o presidente que está no poder, tomou a decisão, e o disse publicamente em palavras e também evidenciando em ações que mais importante que a economia é a saúde e isso para mim é o mais importante em qualquer parte do universo. Me sinto orgulhosa de dizer que o presidente se importa com a população do país onde eu nasci e do país que eu amo,” acrescenta.
Já falando da vida do outro lado do mundo, e as pequenas coisas que a mantém sã durante a quarentena, Alicia fala de música e da luz do sol. “Para mim, ouvir música é algo enorme. E como estou em um lugar menor, sair para caminhar me ajuda também. Tento esquecer de tudo. Não pensar em nada, absorver a luz do sol e pensar que está me recarregando como quando você põe o celular para carregar, até que a bateria chegue a cem por cento.”
E para finalizar, ela divide os aprendizados que a situação de pandemia trouxe para ela. “Acho que eu aprecio um pouco mais tudo o que temos. Há muito o que agradecer e valorizar além do monetário, porque agora que estou em casa, nem o dinheiro importa mais. Os afetos da família, estar sã, ter um teto e comida, são as coisas simples que precisamos para viver. Depois disso, o que vier, eu não sei,” conclui.